Pesquisadores do Hospital Tenon, em Paris, França, descobriram que os pacientes com doença de Alzheimer leve, cuja visão melhorou, após a realização de uma cirurgia de catarata, também apresentaram melhoras de sua capacidade cognitiva, de humor e de qualidade do sono.
Segundo a pesquisadora Brigitte Girard, este foi o primeiro estudo a avaliar especificamente se a cirurgia de catarata poderia beneficiar pacientes com Alzheimer. Pesquisas anteriores já tinham revelado que a cirurgia de catarata melhora a qualidade de vida de pacientes idosos com habilidades cognitivas comprometidas pela baixa visão.
Para realizar o seu estudo, Girard reuniu dados de trinta e oito pacientes, com idade média de 85 anos. Os participantes apresentavam demência leve devido à doença de Alzheimer. Todos tinham catarata em pelo menos um olho e foram adequadamente tratados por meio da cirurgia de catarata padrão, com o implante de lentes intraoculares, que substituem as lentes naturais dos olhos a fim de proporcionar a correção da visão. Depois da cirurgia, a visão dos participantes melhorou drasticamente para o grupo, menos para um dos pacientes com Alzheimer.
Um mês antes da cirurgia, Brigitte Girard avaliou o estado de humor, sinais de depressão, o comportamento, a capacidade de agir de forma independente e as habilidades cognitivas de todos os participantes do estudo. Três meses depois da cirurgia de catarata, os mesmos quesitos foram reavaliados pela pesquisadora, que encontrou um nível de melhora de 25% no estado cognitivo dos pacientes. Eles apresentavam um nível maior de entendimento e de respostas apropriadas ao ambiente.
O nível de depressão, após a cirurgia de catarata, também foi menor em muitos pacientes. Este nível de melhora foi semelhante ao que ocorre normalmente após uma cirurgia de catarata num idoso que não apresenta demência. Girard não encontrou alterações no nível de autonomia dos pacientes, isto é, na sua capacidade de agir com independência, após a cirurgia de catarata.
Ainda segundo a pesquisadora, os padrões de sono e os problemas de comportamento noturnos dos pacientes com Alzheimer também melhoraram bastante, após a cirurgia de catarata. Estudos anteriores já haviam revelado que quando a catarata é removida, os níveis de melatonina – hormônio regulador do sono – se normalizam. Girard acredita que por este motivo os pacientes com Alzheimer apresentaram melhores padrões de sono.
“O estudo francês nos revela que uma melhora significativa da visão resulta num clima positivo de mudanças de comportamento dos pacientes com Alzheimer. Esta informação é muito útil quando pensamos em estratégias para melhorar a qualidade de vida dos pacientes com Alzheimer, de seus familiares e de seus cuidadores”, afirma o oftalmologista Virgílio Centurion, diretor do IMO, Instituto de Moléstias Oculares.
Cirurgia de catarata x melhora da qualidade de vida
Muitos oftalmologistas continuam a usar a medida da acuidade visual como a principal indicação para a realização da cirurgia catarata, apesar das muitas ferramentas disponíveis para medir a qualidade de vida relacionada à função visual.
“Hoje, a cirurgia de catarata é uma resposta personalizada da Oftalmologia para melhor atender às necessidades do paciente. Ainda que a cirurgia não modifique o quadro de Alzheimer e nem impeça o avanço da demência, ela é muito relevante para a qualidade de vida deste paciente”, defende Virgílio Centurion, que também é membro da ALACCSA, Associação Latino-Americana de Cirurgiões de Córnea, Catarata e Cirurgias Refrativas.
“A cirurgia de catarata é um procedimento extremamente eficaz que tem implicações muito maiores para a vida da população idosa, com demência ou não. Sua importância social não pode ser medida por um gráfico de acuidade visual. A falsa crença de pacientes e de alguns profissionais de saúde de que a catarata não deve ser extraída até estar ‘madura’ está privando muitas pessoas de uma melhor qualidade de vida na velhice. Quanto mais precoce for a cirurgia, menor o comprometimento da qualidade de vida, menor o índice de fraturas por quedas espontâneas, maior a integração social, menor a depressão”, diz o diretor do IMO.